Fale por si mesmo. Um desafio! (Sermão) - C. H. Spurgeon
Domingo, 09 de Dezembro de 1877

"Perguntem a ele. Idade ele tem; falará por si mesmo" (João 9.21).

Aqueles entre vocês, caros amigos, que me ouviram em outra ocasião, por certo se lembrarão que nosso assunto era "Jesus Cristo, ele mesmo". Dedicamos atenção à sua bendita pessoa. Nossa fé se fixa nele; nossas afeições são atraídas para ele; todas as nossas esperanças se inclinam na direção dele. Embora tudo que ele tenha dito ou feito seja precioso, é a própria pessoa de Jesus que ocupa o primeiro lugar na nossa estima. Conhecê-lo, crer nele, amá-lo, é a própria essência do cristianismo. Nesta noite, mudamos nosso tema. Há um "ele mesmo" no texto por nós adotado nesta noite - embora esse "ele mesmo" seja de ordem mais humilde. Qual é a situação de cada um de nós para consigo mesmo? Nossa individualidade e as responsabilidades pessoais que recaem sobre nós mesmos em relacionamento com Cristo não devem ser perdidas de vista. Se, por exemplo, um milagre espiritual foi operado em nós, se somos obrigados a confessar - melhor, se nos deleitarmos em confessar - que ele abriu os nossos olhos, então, temos o dever de dar o nosso próprio testemunho sobre dele. A alegação e o apelo podem aplicar-se a cada um de nós igualmente. "Idade ele tem; perguntem a ele; falará por si mesmo." O próprio Jesus Cristo, ele mesmo, carregou os nossos pecados, conforme ouvimos nesta manhã. Ele deu a si mesmo por nós, ele serviu a nós, não por procuração, mas por consagração pessoal; não por esmolas regateadas de modo doloroso, mas pela sua vida entregue espontaneamente como sacrifício a Deus. Já que ele assim nos recomendou seu amor, o mínimo que podemos fazer, com gratidão, é dar o nosso próprio testemunho pessoal dele, com coragem e ousadia.
Que paralelo há entre o caso desse homem e o nosso próprio! Ele sofrera um mal grave e pessoal. Nascera cego. E assim também, nós nascemos no pecado. O pecado lançou sua sombra sobre nossas faculdades desde o nosso nascimento. Nunca nos esqueceremos da meia-noite da nossa natureza. Nem sequer podíamos enxergar as belezas do próprio Cristo, embora ele fosse resplandecente como o sol ao meio-dia, pois éramos tão cegos. Esse homem foi liberto pessoalmente do seu mal, e, assim também, nós fomos libertos. Vocês receberam, assim como recebeu o cego, uma bênção pessoal, sendo que nos foi outorgada a vista. O defeito que arruinava a sua vida foi curado. Não se trata de alguém olhar em lugar de você, e então contar a você o que ele vê, mas você vê por conta própria. Não lhe é imputado que você consegue enxergar, por você ter sido informado o que outra pessoa viu. Agora, você não tem procurador nessa questão, nenhum patrocinador nesse negócio. Você mesmo está consciente de que uma obra de graça foi realizada em você: ao passo que você era cego, agora você vê, e tudo sabe. O cego foi curado mediante a obediência ao mandamento de Cristo. Ouviu uma chamada especial dirigida a ele: "Vá lavar-se no tanque." Ele foi e voltou vendo. E muitos aqui presentes escutaram a voz que diz: "Creia e viva", e ela chegou até você, não como uma exortação geral, mas como orientação específica. Vocês creram e realmente vivem. Vocês se lavaram e voltaram vendo. Pois bem, tudo isso é pessoal, e por isso, o seu Senhor e Mestre tem o direito de esperar que você dê testemunho do seu poder para salvar. Você é maior de idade. Quando alguém lhe perguntar, confio que falará por si mesmo. Tome a palavra e fale com firmeza em favor do seu Mestre, sem hesitação nem medo.

I. HÁ OCASIÕES EM QUE OS HOMENS SALVOS SÃO OBRIGADOS A FALAR POR ELES MESMOS. Devem, por necessidade, dar seu testemunho pessoal.
O que mais podem fazer quando seus amigos os abandonam? O pai e a mãe estavam dispostos a reconhecer esse jovem como filho deles, bem dispostos a dar testemunho de que ele nascera cego, mas não queriam ir além disso. Se quisessem, poderiam ter falado mais, mas tinham medo da sentença de excomunhão, a respeito da qual os judeus já tinham concordado entre si: se alguém confessasse que Jesus era o Cristo, seria expulso da sinagoga. Portanto, os pais sentiram pouco remorso ao se recusarem a assumir qualquer responsabilidade pessoal, pois tinham grande confiança (provavelmente bem fundamentada) na capacidade que seu filho tinha de cuidar de si mesmo, e assim, o abandonaram. Lançaram sobre ele todo o ônus e a tensão de dar uma resposta clara, que o teria incorrido em semelhante censura. Os pais tiraram o corpo fora, para não serem perseguidos porque seu filho cego recebeu a bênção da recuperação da vista. O jovem que fora cego devia, portanto, batalhar por conta própria em favor do bom Senhor que lhe outorgara semelhante benefício. "Perguntem a ele", disseram seus pais, "ele falará por si mesmo."
Existem situações entre muitos jovens, nas quais, mesmo que os pais não desaprovem a religião deles, os tratam com frieza e não demonstram simpatia por sua fé nem por seus sentimentos. Alguns entre nós nos regozijamos quando nossos filhos se convertem. Não sentimos vergonha de tomar o partido deles, de defendê-los e protegê-los de quaisquer consequências que surgirem. Mas existem pais e mães que não gostam das coisas de Deus e, assim, caso seus filhos se convertam, enfrentam uma situação muito difícil. Já soube de alguns que professam ser discípulos de Cristo, que recuam de modo muito suspeito, e deixam por conta de outras pessoas a defesa da causa de Cristo, diante de uma investida vigorosa. Em determinada conversa, esperava-se ouvir aquele cavalheiro já de certa idade tomar a palavra para defender com coragem a verdade do evangelho, mas ele nada fez. Sabia-se que ele era membro de uma igreja cristã, no entanto, conteve-se cautelosamente por longo tempo, e depois, em voz baixa, disse algo a respeito de não lançar pérolas aos porcos. Provavelmente, ele nem tivesse pérolas ou fosse ele mesmo um porco. Que outra explicação se pode dar a tamanha covardia? Mas também sabemos, no ardor juvenil, como é assumir uma posição de desafio, a ponto de se correr o risco de ser acusado de presunçoso, porque todas as demais pessoas pareciam estar desertando a doutrina que era seu dever defender. É lamentável que tantas pessoas tenham medo de se comprometer. "Perguntem a ele; perguntem a ele; ele falará por si mesmo", é seu pretexto insignificante; enquanto isso, têm o cuidado de se retirar detrás dos arbustos, fora do alcance de fuzilaria, e nunca saem do esconderijo a não ser que você conquiste a vitória, quando, então, elas se apresentariam, na melhor das hipóteses, para receber a sua parte dos despojos. Sempre que um homem é colocado na condição de se ver desertado, na batalha por Cristo, por aqueles que deveriam estar ao seu lado, ele desdenha bater em retirada e diz com verdadeiro heroísmo: "Sou maior de idade: falarei por conta própria. Em nome de Deus, vou dar meu testemunho."

Os cristãos, por mais reservada e retraída que seja sua disposição, são obrigados a falar abertamente quando submetidos a uma pressão muito forte. Os fariseus visaram esse homem e o questionaram detalhadamente. Postularam-lhe perguntas na forma de interrogatório minucioso e rigoroso. "O que lhe fez ele? Como lhe abriu os olhos?" e assim por diante. Ele não parece ter ficado perturbado ou desconcertado pelas perguntas. Deu conta de si, grandiosamente. Autossuficiente, quieto, sagaz, inamovível, ele tomara a sua decisão, e, com domínio total da situação, estava pronto para enfrentar os fariseus. Não hesitou. Pois bem: espero que, alguma vez, vocês e eu sejamos chamados para uma prestação de contas e, ao sermos submetidos a perguntas capciosas, mesmo com o intuito de nos emaranhar, nunca fiquemos "envergonhados de reconhecer o nosso Senhor ou defender a sua causa." Deveríamos ser feridos pela mudez se alguma vez ficarmos envergonhados de falar de Cristo ao sermos conjurados a isso. Caso se chegue a um desafio, no tocante ao lado que apóio, eu hesitaria, alguma vez, em dizer: "Estou com Emanuel, o Salvador crucificado"? Se alguma vez eles nos encostarem contra a parede e disserem "Você também esteve com Jesus de Nazaré", que Deus nos dê graça para respondermos com prontidão e sem hesitação: "É claro que estive, e é claro que ainda estou. Ele é meu Amigo, meu Salvador, meu tudo; e nunca me envergonharei de reconhecer o seu nome." Os cristãos devem tomar posição, e cada um dar, por si mesmo, testemunho nítido e distinto.

Ao passo que outros vituperam e caluniam o nosso Senhor Jesus Cristo, a nós cumpre recomendá-lo e louvá-lo. Os fariseus disseram a esse homem: "Para a glória de Deus, diga a verdade. Sabemos que esse homem é pecador." Então o homem falou, todo agradecido, com seu coração borbulhando de gratidão. "Ele me abriu os olhos." "Uma coisa sei: eu era cego e agora vejo." Mas quando estiveram a ponto de dizer: "Quanto a este, nem sabemos de onde ele vem", o homem tomou a palavra de modo mais heroico ainda. Voltou-se contra os que o atacavam e os repreendeu pela notável ignorância deles: "Vocês não sabem de onde ele vem", e ele lutou em favor do seu Mestre de modo tão mordaz que eles sentiam vontade de jogar fora o debate como arma e apanhar as pedras dos insultos para apedrejá-lo. Oh! se falarem mal de Cristo, manteremos silêncio? Quando a imprecação faz gelar o sangue, nunca dirigiremos uma palavra de repreensão ao blasfemo? Ouviremos a causa de Cristo condenada na sociedade e, por medo do homem fraco, refrearemos a nossa língua ou atenuaremos a questão? Pelo contrário, vamos lançar o desafio em favor de Cristo, e dizer, imediatamente: "Não posso, nem quero, me refrear. Agora as próprias pedras poderiam falar. Quando meu amigo querido - meu melhor amigo - é assim ofendido, preciso proclamar as honras do seu nome, e assim farei." Acho que os crentes neste país não se aproveitam de metade da liberdade que têm. Se falarmos uma palavra de religião, ou abrirmos a nossa Bíblia num vagão ferroviário ou em qualquer outro transporte público, dizem: "hipócritas!" Eles podem jogar baralho, suponho, num trans-porte público, com total impunidade: podem deixar a noite mais feia com seus uivos, e proferir profanidades de todos os tipos, com toda a liberdade, mas nós seríamos realmente considerados hipócritas se usássemos de igual liberdade. Em nome de tudo quanto é livre, teremos a nossa vez. E, de vez em quando, gosto de ouvir vocês cantarem, para maior perturbação deles, um dos cânticos de Sião, pois eles cantarão as canções da Babilônia num volume suficiente para nos perturbarem. Vamos dizer-lhes que enquanto vivermos num país de liberdade, e nos regozijamos porque Cristo nos libertou, não teremos mais vergonha de dar testemunhos de Cristo do que eles têm das suas iniquidades. Quando eles começarem a pecar e ficarem com vergonha de falar uma palavra licenciosa, então poderá ser a hora - não, e nem sequer então - para guardarmos a nossa religião para nós mesmos.
Vocês percebem, então, que há ocasiões nas quais os homens - homens quietos e reservados - devem falar. Serão traidores se não falarem. Aquele cego não era muito falador. A brevidade das suas respostas parece indicar que ele era um pouco conciso para falar - mas eles o obrigaram a isso. Ficou sendo como um cervo acossado pela caça. Ele foi obrigado a discutir, por mais suave que fosse a sua disposição. E acho que dificilmente existe um cristão que tenha conseguido palmilhar o caminho inteiro para o céu e, ainda assim, esconder-se na quietude, correr de esconderijo em esconderijo, passando sorrateiramente para a glória. O cristianismo e a covardia! Que contradição entre esses termos! Acho que deve ter havido ocasiões em que vocês se sentiram dispostos a falar de si para si: "Pois bem, custe o que custar: a sociedade pode lançar tabu contra mim; posso ser ridicularizado pelas pessoas mais grossas, e posso perder o respeito das pessoas mais fina; mas preciso dar testemunho a favor de Jesus Cristo e da sua verdade." Então, as seguintes palavras passaram a se aplicar a vocês: "Idade ele tem; perguntem a ele; ele falará por si mesmo."

II. É SEMPRE BOM ESTAR PREPARADO PARA FALAR POR CONTA PRÓPRIA. Parece claro que esse homem estava pronto para isso. Quando os pais dele disseram: "Perguntem a ele... falará por si mesmo", havia uma leve piscadela no olho do pai enquanto este falava - com a intenção de dizer: "Vocês vão lidar com uma pessoa intratável. Ele pode falar por si mesmo. Já o conhecemos durante os muitos anos da sua cegueira, e ele sempre tinha uma resposta mordaz para qualquer pessoa que o considerasse bobo; se vocês imaginam que conseguirão da parte dele muita coisa para alimentarem as gargalhadas ou diversão de vocês, estão redondamente enganados. É mais provável que ele se desfaça de vocês, do que vocês dele." E assim, ao entregarem-no aos inquisidores, embora não fossem muitos bondosos, suponho que não achassem que ele fosse um franguinho tenro que precisasse dos seus cuidados; assim, pareciam dizer: "Idade ele tem, já é maior de idade; perguntem a ele. É só perguntar a ele. Po-demos garantir que ele falará por conta própria." E falou mesmo! Ora, aqui quero ter um grupo de cristãos do tipo bem semelhante a ele, e que, quando alguém lhes perguntar algo a respeito da sua santa fé, possam responder de tal maneira que não sejam objetos de escárnio e desprezo, porque revelarão ser mais do que suficientes para enfrentar seus adversários. Mas como, vocês estarão prontos para responder, devemos estar preparados para falar por conta própria?
Desde o início, é bom cultivar um hábito geral de franqueza e de coragem. Não temos necessidade de sermos intrusos e de nos intrometermos no caminho das pessoas e assim nos tornarmos uma amolação e enfadonhos para elas. Longe disso! Mas andemos pelo mundo como aqueles que não têm nada para esconder, conscientes da integridade dos nossos próprios motivos e da retidão do nosso coração diante de Deus; sem precisarmos vestir a armadura e dormir com ela como os cavaleiros da Antiguidade, sabedores de que a verdade desarmada é o melhor vestuário. Mostremos que nada temos para dissimular ou encobrir, nada para disfarçar ou manter no escuro - que o evangelho operou em nós tamanha honestidade e franqueza de espírito e nenhuma tagarelice nos pode levar a enrubescer, e nenhum inimigo pode nos provocar. Contemos aquilo que cremos como sendo a verdade, porque podemos garantir a sua veracidade. Vamos silenciar aqueles que levantam objeções contra tais coisas, não tanto pelo nosso combate quanto pelo nosso caráter. Comprovemos diante deles que temos razão sólida pelo nosso protesto singelo; que realmente recebemos a graça na qual cremos com sinceridade. Nossas palavras terão peso quando os oponentes perceberem que o fruto da nossa piedade está em consonância com a flor da nossa profissão de fé. Há grande poder nesse modo de responder ao adversário.

Tome o cuidado, no entanto, quando você falar, de ter certeza do seu fundamento. Esse homem tinha essa certeza. Disse: "Não sei se ele é pecador ou não"; e assim não ofereceu opinião a respeito de um assunto sobre o qual não tinha conhecimento positivo. Mas quando tinha com fatos sólidos, não havia nada de vago na sua declaração: "Uma coisa sei: eu era cego e agora vejo!" Esse é um argumento que o crítico capcioso mais astuto teria dificuldade em refutar. Com o cego olhando diretamente para o rosto deles, bastava para deixálos perplexos. E existem alguns entre vocês que passaram por tamanha transformação de caráter que podem dizer, com a pura verdade: "Sei que não sou o homem que era antes. Minha maneira de viver, desde a minha juventude, é bem conhecida de muitos, se quisessem testificar. Mas agora, Deus, mediante o evangelho do seu Filho, abriu os meus olhos, purificou a minha lepra e colocou meus pés no caminho da paz." Mesmo aqueles que zombam do evangelho não conseguem, como muitos entre nós, negar a mudança notável e benéfica que se realizou. Nisso há uma questão de integridade sobre a qual devemos ser muito firmes. Assuma uma posição de firmeza e diga: "Não, vocês não podem julgar isso de modo errôneo. Vocês podem filosofar se quiserem, mas foi o evangelho simples e antiquado das crianças que me transformou, e me levou a amar o que eu antes odiava, e odiar aquilo que eu antes amava. Essa é uma coisa que vocês não podem refutar. É uma coisa que sei."
E é bom, como no caso desse homem, ter os fatos em prontidão para serem aduzidos. "O homem chamado Jesus misturou terra com saliva, colocou-a nos meus olhos, e me disse que fosse lavar-me em Siloé. Fui, lavei-me, e agora vejo." Apresentem o plano da salvação, do modo que vocês o perceberam de início, de modo muito sucinto e claro diante deles. É frequentemente a melhor resposta que vocês podem apresentar diante daqueles que interrogam com o propósito de por defeito e que discutem para depreciar. Contem a eles sobre o evangelho com a mesma emoção com que vocês o receberam na ocasião. Assim como o Senhor lidou com sua alma, assim também contem a eles o que ele fez em favor de vocês. Quem consegue zombar da declaração simples que você faz da sua conversão, forçosamente é um homem de coração endurecido. A transformação que assim foi realizada em você será um fato que ele não poderá contestar. Embora pense que você foi iludido e o chame de fanático, a coisa mais difícil para ele será vir de braços com a sinceridade e confiança que você tem. "Ele abriu meus olhos; e se ele abriu meus olhos, logo, ele veio da parte de Deus. Forçosamente, Deus estava no meio dessa questão, pois nasci cego." Dê uma razão para a esperança que está em você, com mansidão e respeito, a todos quantos se opõem a você.
Os cristãos devem ser como era esse homem - bem disposto a suportar ofensas. "Você nasceu cheio de pecado." Não posso imaginar que o cego se importasse com aquilo que eles queriam asseverar ou insinuar sobre isso. O desprezo deles não poderia privá-lo de seus olhos. Ele simplesmente sacudiu a cabeça e disse: "Agora vejo; consigo ver. Eu era cego e agora vejo! Os fariseus podem me ofender, mas agora vejo. Podem me dizer que sou isto mais aquilo, e ainda coisa pior, mas agora vejo! Meus olhos foram abertos." Assim, filho de Deus, você pode dizer de si para si: "Posso ser ridicularizado; posso ser censurado como presbiteriano ou metodista, batista ou cismático, ou como qualquer outra coisa que quiserem dizer; não me importa. Fui salvo; sou um homem transformado. A graça de Deus me renovou; agora podem me chamar de tudo quanto quiserem." Algumas pessoas ficam incomodadas ao serem satirizadas; diante de uma piada, se encolhem e se sentem lesadas; e aquilo que os homens chamam de gracejo as irrita. O homem que não consegue suportar a risada de um tolo ainda parece um bebê! Mantenha-se firme em pé, e quando você voltar ao seu emprego na loja de tecidos, comporte-se destemidamente. Você que vai trabalhar em alguma grande fábrica e que sofreu interrogatórios e gozações por causa da sua religião, renove sua coragem e diga: "Aqui estou eu, com 1,70 ou 1,80 metro de altura, ou seja qual outra altura, e vou sentir vergonha de alguém rir de mim por causa de Cristo?" Nada disso! Ora, você nem vale os calçados que o deixam em pé, se você se deixa abaixar diante das brincadeiras deles. Não duvido que muitos soldados no refeitório da caserna acham difícil manter o ânimo quando os colegas escarnecem deles com zombaria e desprezo de maneira grosseira; mas afinal, caros amigos, a varonilidade comum não deve nos animar com força moral? Ao conseguirmos lançar mão de uma coisa que consideramos certa, seríamos muito simplórios se abríssemos mão dela por medo de um trote tonto ou de uma careta à toa. Deixe que eles riam. Vão se cansar de nos apoquentar quando descobrirem que nosso temperamento triunfa sobre os truques tolos deles. Deixe os pobres simplórios achar nisso motivo de diversão. Eu, às vezes, me sinto mais disposto a sorrir do que a me entristecer diante das piadas que são contadas às minhas custas. Seus gracejos brincalhões talvez aliviem algumas das lastimáveis tristezas que baixam inesperadamente nas horas de solidão deles. A melancolia celebra carnaval neste mundo louco. E se, de vez em quando, pegam um objeto vivo para sua diversão, e eu mesmo acabo sendo o alvo dos bufões, e daí? Não há possibilidade de que eu seja lesado com isso; o único perigo é que eles possam se prejudicar. Tenham essa atitude, caros amigos, e não se importem com essas bobagens.
Esse homem, nascido cego, cujos olhos foram abertos, estava disposto a enfrentar os fariseus e a tomar a palavra por conta própria, porque sentia intensa gratidão por Jesus, que lhe outorgava o benefício inestimável da visão. Vocês percebem que durante toda a narrativa, embora ele não soubesse muita coisa a respeito de Jesus, tinha consciência de ser este seu verdadeiro amigo, e se mantinha leal a ele, em meio a todas as circunstâncias. Ora, é possível que você e eu não saibamos muita coisa a respeito de nosso Senhor - nem a décima parte daquilo que esperamos vir a saber -, mas ele abriu os nossos olhos; ele perdoou os nossos pecados; ele salvou a nossa alma; e, com a ajuda da sua graça, seremos leais a ele aconteça o que acontecer. Se a gratidão que vocês têm por ele for mantida plenamente, não há o que recear quando forem provocados, quando forem submetidos à prova, não deixarão de ser fiéis ao seu amigo e serão capazes de dizer, em sã consciência:

"Não sinto vergonha de meu Senhor,
Nem de sua causa ser um defensor;
De a honra da sua palavra manter,
A glória da sua cruz ver."

III. TODA PESSOA SALVA DEVE ESTAR DISPOSTA A FALAR POR SI MESMA A RESPEITO DE CRISTO. Já falei que vocês serão levados a isso. Além disso, vocês devem estar preparados quando forem forçados a isso; mas agora estão sendo conclamados a fazer isso de livre e espontânea vontade.
Não somos todos devedores a Cristo se, realmente, fomos salvos por ele? Como poderemos reconhecer essa dívida se nos envergonharmos de Cristo? O testemunho dele é: "Aquele que crer, e for batizado, será salvo." O batismo nos salva? Certamente não, mas aquele que crer é obrigado a ser batizado a fim de assim confessar ao seu Senhor; pois o batismo é "o compromisso de uma boa consciência diante de Deus" (1Pe 3.21). É a resposta grata do discípulo à chamada graciosa do seu Mestre. Vocês sabem como isso se expressa: "Aquele que crê no seu coração e confessa com sua boca será salvo." Não posso legitimamente deixar de confessá-lo, se eu crer no meu coração. Por que eu deixaria de fazê-lo? Já que lhe devo tanto, posso eu pensar em não confessá-lo? Tenho certeza de que, se fosse promulgado um mandamento que nos proibisse de reconhecer o nosso Senhor, de falar sobre ele a alguém, e que nos ordenasse a esconder o segredo dos parentes, dos amigos, e dos vizinhos, eu o acharia muito aflitivo. Mas ele realmente nos manda reconhecê-lo e dar testemunho a ele. Saudamos essa ordem da parte dele, a consideramos muito correta e apropriada, e a ela obedecemos com a maior alegria. Não é assim?
Cada um de nós deve estar bem disposto a tomar a palavra em nome de Cristo, pois cada um, individualmente, deve saber mais sobre o que ele fez em nosso favor, pessoalmente. Ninguém aqui sabe tudo o que Cristo tem feito por mim. E vocês podem dizer: "É verdade, mas, por outro lado, você não sabe o que ele fez por nós." Não, não; todos nós somos devedores a ele, em tudo. Oh, quão grande misericórdia ele tem dado a alguns de nós! Se o mundo pudesse conhecer o nosso estado antes da nossa conversão, talvez nossos cabelos ficassem arrepiados só ao lermos a história da nossa vida. Como a graça de Deus nos transformou! Que mudança! Que transformação! Se os corvos se transformassem em pombos, e os leões se tornassem cordeiros, os charlatões poderiam expor (ou mistificar) o fenômeno com uma ou duas palavras. Mas essas conversões ocorrem todos os dias; e os cientistas mantêm silêncio, ao passo que os zombadores, quando as vêem, fazem caretas contra elas. A transformação é infinitamente maior do que quando os ossos secos são ressuscitados e revestidos de carne. Quando as pedras começam a derreter e a se transformar em correntezas, isso não é nada em comparação com a regeneração que experimentamos. Precisamos contar isso; precisamos conversar a respeito. Sabemos mais a respeito do que as demais pessoas, e temos a obrigação de sermos narradores honestos da narrativa maravilhosa.
Quanto mais testemunhos individuais são dados a respeito de Cristo, tanto maior a força acumulada da soma total deles. Se eu, de modo coletivo, der testemunho de Cristo, em nome de todos vocês, dizendo: "O Senhor fez grandes coisas por nós, e por isso estamos alegres", espero que Cristo seja honrado e que haja alguma boa influência. Mas, se dez, vinte, trinta ou cinquenta pessoas se colocassem em pé, uma após outra, e dissessem: "O Senhor fez grandes coisas por mim", e cada uma contasse a sua própria história, mais convicção seria produzida! Ouvi falar de um advogado nos Estados Unidos que foi para uma reunião dos vizinhos, onde contaram as suas experiências. Era cético, um incrédulo, quando entrou no local, mas ficou sentado ali tomando nota, com seu lápis, das declarações dos vizinhos. Quando, depois, revistou as evidências, disse de si para si: "Ora, se eu tivesse essas doze ou treze pessoas no banco das testemunhas, apoiando minha causa jurídica, eu teria absoluta certeza de vencer o processo. Convivo entre elas. Não são as pessoas mais eruditas que já conheci, mas são bem honestas, fidedignas - com conversa sincera; e, embora cada uma tenha contado sua própria história, todas apontam o mesmo fato: que existe a graça de Deus, e que ela realmente transforma o coração." E assim chegou à sua conclusão: "Pois bem, sou obrigado a crer, depois de tantos testemunhos." E acreditou mesmo e se tornou cristão. Tenho certeza de que se os cristãos testemunhassem mais frequentemente sobre o poder de Jesus Cristo, os testemunhos acumulados surtiriam efeito em muitas mentes irrefletidas, e multidões chegariam a crer em Jesus. O Espírito Santo se deleita em aceitar e abençoar tantas histórias verídicas quanto vocês puderem contar.
Estou ouvindo um e outro entre vocês dizer: "Podem muito bem passar sem a minha história?" Eu responderia: "Não, meu amigo, não podemos dispensar a sua evidência, posto que as diversidades entre as experiências são tão numerosas quanto o são os indivíduos convertidos, embora haja união na operação do Espírito Santo." Nosso Senhor abriu os olhos de muitos cegos, desobstruiu os ouvidos de muitos surdos, libertou a língua de muitos mudos, e é incontável o número dos leprosos que purificou; mas cada paciente poderia contar a você os seus próprios sintomas e a cura que recebeu, com pormenores. A sua história também tem seu interesse especial, enquanto contribui para a narrativa global. Você, pelo menos, ficaria triste se não fosse assim. "O SENHOR escreverá nos registro dos povos: 'Este nasceu ali.'" (Sl 87.6). Sei que vocês gostariam que seu nome fosse mencionado então; e acho que, para você, valeria a pena mencionar agora as misericórdias que você recebeu, exatamente do modo que as recebeu. Falando por mim mesmo, creio que Deus, ao me converter, manifestou um modo específico de fazê-lo, exatamente ajustado à minha necessidade. Meu caso era tão semelhante aos de vocês, que produziu simpatia, e tão diferente, que produziu gratidão especial, e assim acontecia, sem dúvida, com cada um de vocês. Em cada caso, a carreira de vocês, o seu caráter, e as suas circunstâncias eram diferentes. Assim como um mestre-pintor raras vezes pinta o mesmo quadro duas vezes, assim também Deus, o Artista supremo, raras vezes (acho que mesmo nunca), opera exatamente o mesmo modo em dois corações diferentes. Existe uma diferença, e naquela diferença há uma ilustração da multiforme sabedoria de Deus; por isso, queremos ouvir a sua história.
Além disso, o seu testemunho talvez toque no coração de alguém semelhante a você. A jovem Maria, sentada ali, diz: "Ora, eu não sou ninguém; sou mera babá. É verdade que o Senhor Jesus Cristo me purificou e me adotou, mas vocês podem passar sem a minha história." Não, Maria; não podemos passar sem ela. Talvez seu testemunho seja apropriado para outra mocinha como você. Uma empregadinha atendia a esposa de Naamã. Quem, a não ser ela, poderia ter contado à sua senhora que havia cura para Naamã, ou que ele podia ir a um profeta em Israel e ser plenamente restaurado? Conte sua história de modo suave e calmo, e em momentos apropriados, mas deixe que ela seja conhecida. O idoso diz: "Oh, mas agora estou tão fraco. Você pode dispensar qualquer coisa que eu tenha para dizer." Não, sr. Guilherme, não podemos. O senhor é justamente o homem cujas poucas palavras têm pleno peso. De vez em quando, você se encontra com oportunidades selecionadas de levar almas ao Salvador. Alguém pode dizer: "Estou velho demais para pensar nessas coisas"; mas você pode contar como o Senhor lidou com você na sua velhice, e talvez alguém se aproveite da lição. Ora, vocês, operários, se todos tomassem a palavra em favor de Cristo (e sei que muitos entre vocês o fazem), que bom efeito seria produzido; que influência vocês teriam sobre outras pessoas semelhantes a vocês. Obviamente, elas nos ouvem pregar e dizem: "Vocês sabem que ele é pastor. Fala assim por dever profissional. Dizer essas coisas é o emprego dele." Mas quando você conta a respeito daquilo que o Senhor tem feito por você, fica sendo assunto de conversa; esta é repetida muitas e muitas vezes. Sei o que Tomé diz ao chegar em casa. Diz à sua esposa, Maria: "O que você acha daquele Tiago que é meu colega de serviço? Ora, andou falando comigo a respeito da sua alma, e disse que seus pecados foram perdoados, e parece ser um homem tão feliz. Você sabe que ele bebia e xingava da mesma maneira que eu, mas agora, é um homem maravilhosamente diferente; e eu diria, na base daquilo que estou vendo, que deve existir alguma verdade nisso. Um fim de tarde, me convidou para ir à sua casa; o seu lar é tão diferente do nosso." "E quanto a isso, você pode calar a boca", Maria responde, com bastante rispidez; "se você trouxesse seu salário para casa, todas as semanas com regularidade, eu poderia gastá-lo melhor cuidando da nossa casa." Tomé responde: "Estou pensando a mesma coisa. Justamente por ser Tiago um homem religioso é que ele realmente leva para casa o salário inteiro, e acho que há alguma coisa real na conversão dele. Ele não bebe como eu. Não participa de farras e besteiras de todo tipo. Eu, nem teria levado o assunto tanto a sério se o pastor tivesse me falado. Mas agora realmente acho que há algo de bom e genuíno na graça a respeito da qual ele fala. Seria melhor irmos, nós dois, no domingo de noite ao Tabernáculo, ou a outro lugar, e ficarmos sabendo sobre o assunto por nossa conta." Ah, muitíssimas almas são levadas a Cristo dessa maneira. Por isso, Tiago, não podemos passar sem seu testemunho, porque a sua conversa é apropriada para seu próprio grupo. E quanto a você, dama refinada, você diz: "Eu amo o Senhor, mas acho que eu não posso dizer nada no meu círculo e no meu nível de vida." Você não pode? Ah, mas tenho certeza de que você transporá essa pequena dificuldade para atingir um pouco mais de crescimento na graça. Tínhamos entre nós, certa vez, uma pessoa cujo título de nobreza a qualificava a conviver numa esfera "superior" da sociedade, mas sua escolha a capacitou a preferir o humilde companheirismo da igreja. Alguns dentre vocês se lembram bem das madeixas prateadas dela. Ela já partiu de nós, e voltou para o lar na glória.
A sua sorte era lançada entre a aristocracia. Entretanto, com simplicidade mansa, despretensiosa e suave, introduzia o evangelho sempre por onde andava. Muitas pessoas que vieram para ocupar esses bancos da igreja e escutar esse ministro nunca teriam chegado aqui não fosse a vida dela, calma, bela, discreta e santa, e a coragem com que podia dizer, em qualquer lugar e em qualquer ocasião: "Sim, sou cristã; e, mais do que isso, sou dissidente da igreja anglicana; e o que você considerará pior, sou batista; e o que você considerará ainda pior, sou membro do Tabernáculo." Ela nunca se envergonhava de confessar o nome do nosso bendito Redentor, nem de reconhecer os mais humildes dos discípulos de Jesus e lhes oferecer amizade. Vocês fariam bem em seguir o exemplo da fé que ela tinha. Sejam quais forem os círculos em que convivemos, esforcemo-nos para nos tornar centros de influência.
Foi assim que procurei demonstrar a vocês, caros amigos, que cada pessoa tem seu testemunho para dar - um privilégio a ser acalentado não menos do que um dever a ser cumprido -, porque um dom que você recebeu qualifica-o para um serviço que pedem que você desempenhe. Suponhamos que o soldado, ao marchar para a batalha, dissesse: "Não preciso carregar meu fuzil; não preciso atirar no dia da batalha, porque há bons atiradores à direita e à esquerda que estão acertando nos inimigos." Sim, mas quando você estiver em plena fuzilaria, o seu projétil tem seu alvo, e esse alvo do seu projétil não é o alvo de nenhum outro projétil, por isso, atire e deixe-o voar. Todos nós devemos atirar, irmãos; não alguns, a nossa munição deve ser esta: "Uma coisa sei: eu era cego e agora vejo! É por isso que dou testemunho do meu Senhor. Apesar de quem queira dizer o contrário, ele me abriu os olhos."

IV. E, por fim: POSTO QUE TODO CRENTE, POR TER IDADE, DEVE FALAR POR SI MESMO, NÓS PRETENDEMOS FAZER O MESMO; VAMOS FAZÊ-LO. 

Quanto a mim, pretendo fazer assim. Tenho falado a vocês aquilo que acredito ser a verdade, desde a juventude. Já ofendi pessoas em muitas ocasiões. Espero ofender ainda bastante mais vezes, porque a questão de ofender não é assunto que tomo em consideração em qualquer ocasião. A questão é: Essa é a verdade? É uma verdade necessária? É essencial que seja falada com clareza e divulgada amplamente? E aí sai voando como uma granada de mão jogada no meio da multidão. Que cada ministro de Cristo - e espero que a justiça dessa atitude seja cada vez mais reconhecida - tenha a coragem para falar em favor do seu Mestre; fale abertamente, e nunca resfolegante, mas em nome daquele que o enviou, em nome de Deus, com coragem apropriada para sua comissão. Lábios trementes e rosto covarde num ministro revelam ser ele indigno do cargo que alega desempenhar. Devemos deixar nosso rosto firme como seixo, e dar testemunho da vontade - da verdade inteira, e de nada, senão a verdade, conforme Deus a ensina a nós.
E vocês, membros desta igreja, e vocês, crentes de todos os tipos aqui presentes, vocês não querem, também, adotar esta resolução: "Somos maiores de idade e pretendemos falar por nós mesmos"? Nem todos vocês podem pregar. Espero que todos não tentem fazê-lo. Como o mundo ficaria tumultuado e desordenado se todo homem e mulher se considerassem chamados a pregar! Teríamos uma igreja que só consistiria de bocas, e então haveria um vácuo em parte dela. Não sobrariam mais ouvintes se todos virassem pregadores. Não; vocês não foram chamados para procurar posições de precedência nas assembléias públicas, mas para exercer influência no convívio em particular; mediante uma boa conversa, com uma fala temperada com sal, em casa entre os amigos, os parentes, ou os colegas, com uma dúzia de pessoas ou com uma só, tornem conhecido o que o amor tem feito, o que a graça tem feito, o que Cristo tem feito. Deixem todos saber; tornem tudo isso conhecido. Entre seus empregados, entre seus filhos, entre os lojistas - para onde vocês forem, deixem-no conhecido. Usem seus uniformes por onde forem. Não gosto de ver um soldado cristão que tenha vergonha de ostentar as suas cores. Pelo contrário, vistam-nos. É uma honra servir a sua Majestade. Se houver no cristianismo algo que deixe você enverg

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